terça-feira, 23 de dezembro de 2014

cinema em 1 take


Orson Welles chegou ao âmago num trenó.


Glauber Rocha girou piões e deu arrimo ao sol.

Peter Sellers vendeu a alma ao sete peles.


Bergman vestiu o silêncio de matizes cinza.


Kurosawa fez do sonho um storyboard da vida. 
 

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Gravitação

                                                           Escher, Relatividade, 1953





pelas paredes

deste escritório de inutilidades

escalam palavras,

sussurros tresloucados.

e, então, do teto

precipitam-se

suadas

em desespero,

que é vontade de ver.



sem o que dizer, na queda dizem:

quem nos salvará do suicídio?



antes que caiam num baque surdo ao chão, porém,

tentação de servir a quem as salvou,

uma pena, talvez ponta de areia,

vidro ou espelho,

mantém-nas suspensas,

constrói limbo de linotipos,

deixando-as livres, à revelia.



enquanto isso,

traças digerem

tranquilamente

as páginas de um velho livro.

En dehors



                                                               foto: google imagens




Abre fecha compasso

ângulo reto com o torso

braços leves em disciplina

de chavear o chão

ao correr de riscos

na ponta dos pés.



Tesoura flexionada

corta bicos no ar

depois se abre, régua

impulso de breves quadris

e o queixo inexorável

mira um alvo obtuso.



A sapatilha pesponta vírgulas

no tablado, palco, papel

onde o cetim esconde

duro grafite, calos nos dedos

unhas partidas, sangue pisado

enfim os traços



do texto preciso

que cria a bailarina.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Exposição Manoel de Barros

No começo de 2014 foi exposto um belo trabalho no Sesc-Rio Preto em homenagem à poética do saudoso Manoel de Barros, que nos deixou em 13 de novembro. Publico tardiamente alguns registros que tive a oportunidade de fazer.












Para fechar, um dos meus poemas preferidos. Por questões de direitos autorais, reproduzi apenas um trecho do texto:


O apanhador de desperdícios

Uso a palavra para compor meus silêncios.
Não gosto das palavras
fatigadas de informar.
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água pedra sapo.
Entendo bem o sotaque das águas
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim um atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato
de canto.
Porque eu não sou da informática:
eu sou da invencionática.
Só uso a palavra para compor meus silêncios.